sábado, 26 de maio de 2012

LEMBRANÇAS


            Há algumas lembranças que nunca nos deixam, umas são ruins e outras boas. É bom acreditarmos que tudo pode ser aproveitado para o nosso crescimento. Mesmo as nossas feridas podem tornar-se experiência de vida para nos impulsionar para frente. Alguns dos momentos que vivemos vão nos acompanhar para sempre. Santo Tomás de Aquino, um grande santo para nós católicos, reconhecido e estudado pela teologia, pela filosofia e por outras ciências, dizia algo que nos ajuda em muitas questões: “há uma diferença entre o sentir e o consentir”.  É uma grande verdade! Só que temos que ter um pouco de habilidade na arte da vida para sabermos lidar com tudo, mesmo as feridas vão ser lembradas sempre, pelo menos enquanto tivermos uma boa mente. A maneira como as lembramos e, principalmente, que atitude vamos tomar quando lembramos é o mais importante. Podemos sentir raiva, por exemplo, mas não permitirmos que ela nos destrua é o segredo.
          Gostamos muito dos assuntos ligados ao crescimento psicológico humano, mas o que desejo neste encontro é mais simples, é uma outra parte no campo das lembranças. Falamos do que podemos fazer com nossas lembranças porque é sobre uma delas que desejo tratar. É evidente que, estando no campo de minhas próprias experiências, está ligada à minha interpretação. Diante do fato narrado, cabe a você, querido leitor, tirar suas conclusões.
          Quando estava vivendo o meu ministério em Ouro Branco, no período de 2005 a 2008, se não me falha a memória, ia de carro de Jardim do Seridó a Ouro Branco, era um final de tarde. Comigo ia Marcondes de Equador, meu afilhado de Crisma, e um senhor que ia para uma das comunidades daquele município. Em um trecho da estrada nos aproximamos de uma família, à nossa frente, em uma moto. Era o pai, guiando o veículo, a mãe e uma linda criança, bem segura, em seu colo, de modo que, como íamos todos bem devagar, dava para vermos bem a criança, como também dava para ela nos ver. Não quero entrar na questão se era seguro ou não para aquela criança viajar deste jeito. O interessante é que quando percebemos a criança estava fazendo o sinal de saudação para todos nós do carro, “dando tchau”, como dizemos no popular. O sorriso daquela criança nunca saiu do meu pensamento. Retribuímos o gesto, e, entre sorrisos e palminhas, ela nos dava os braços, como que dizendo que tinha coragem de pular se pudesse. E teria, pois uma criança é pura e sempre confia. O fato foi este, tão simples, tão cheio de significados.
          Aquela criança, de no máximo três anos de idade, me fez naquele dia uma pregação do Evangelho tão forte que nunca esqueci. Algumas pessoas de Ouro Branco lembram, com certeza, de uma homilia que fiz meditando este acontecimento. Em pequenos toques Deus nos dá a oportunidade de vermos como é o homem, como Ele pensou, como Ele nos criou e, também, como nos tornamos muitas vezes. Vivemos naquele dia uma verdadeira aula de vida, aprendemos a ciência do amor de um pequeno coração que nem sabia ainda ler ou escrever. Aquela criança não tinha, naquele tempo, contato com nenhuma de nossas ciências, mas nos deu uma “bofetada” do que é viver, do que deve ser a vida de todos nós, isto é, confiança, capacidade de aproveitar os momentos, desejo de comunicar-se, entrega, acolhimento... o que tanto podemos ver naquele desejo de brincar, de ser uma criança?
          Entre tantas possibilidades de interpretação o que podemos pensar? Que mesmo estando em um veículo que ela não dominava, mesmo não estando sentindo o chão em seus pés para lhe dar segurança, ela sentia-se plenamente segura, afinal estava no colo da mãe, laçada pelos braços da mãe, tendo à frente o pai. O mais interessante foi a capacidade de acolher estranhos que a criança tem. Certamente alguns podem dizer que é isto que  as tornam desprotegidas, é verdade, mas também é isto que as tornam a esperança, é isto que nos dão a possibilidade de ver como éramos quando puros, quando acreditávamos na fantasia, no amor, quando o outro era nosso amigo, igual a nós e não um inimigo perigoso. Ela não nos conhecia, mas antecipou-se, comunicou-se e sorriu. Como poderíamos ser assim, mesmo que um pouco!
          A verdade é que o tempo passa, e muitas vezes, em vez de crescer em todos os níveis, murchamos, deixamos a rotina nos roubar a capacidade de ver o outro como um irmão, morador de nossa grande casa. Pelas dores e feridas nos fechamos, paramos de acreditar até em nós mesmo, quando mais no outro! Aquela criança tinha motivos para ter medo, mas ela acreditou na segurança dos pais, ela tinha motivo para ter medo de nós, mas foi ela quem nos atingiu com o seu amor cativante. As crianças estão prontas para acolher, mesmo que briguem e se zanguem, estão prontas para perdoar e recomeçar. Não desejo esgotar, e nem poderia, as possibilidades desta minha visão, para mim positiva; deixo o mais para cada leitor, como já disse. Esta história me faz lembrar de Jesus Cristo. Deixo que Ele fale e conclua esta minha lembrança.
          “Naquela hora, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram: “Quem é o maior no Reino dos Céus?” Jesus chamou uma criança, colocou-a no meio deles e disse: “Em verdade vos digo, se não vos converterdes e não vos tornardes com crianças, não entrareis no Reino dos Céus. Quem se faz pequeno com esta criança, esse é o maior no Reino dos Céus. E quem acolher em meu nome uma criança como esta, estará acolhendo a mim mesmo” (Mt 18, 1-5).

Pe. Rômulo Azevedo da Silva

Um comentário:

  1. Como digo sempre meu querido amigo o senhor é ungido e um verdadeiro servo de Deus, muito sábio e procuro sempre le ouvir e de suas palavras fazer pratica em minha vida.um grande abraço.Régia

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